Nerve em modo auto-sabotagem no Salão Brazil
Nerve deixou “só mais um pedaço” da sua vida em Coimbra. Em dia de casa cheia, o piano só foi utilizado para pousar a garrafa de água e o MC português só saiu do Salão Brazil em ovação. Auto-sabotagem em ação.
A sala de espetáculos da baixa coimbrã voltou a receber Nerve, literalmente dois anos depois do seu último concerto num dos espaços mais culturais da cidade. Desta feita, o rapper não trouxe cópias do álbum de 2016 T&C/AVNP&NMTC, mas sim do seu último trabalho, Auto-Sabotagem, com o qual abriu a noite. Sozinho no palco, vestido de negro e com letras fúnebres e narcisistas, Nerve continua (e continuará?) a atuar de forma singular: um microfone e um público passivo-agressivo.
A sala escura ditou o cenário. Partiu de “Plâncton” a “Breu”, num alinhamento quase perfeito. Deixou “Deserto” como a sexta faixa do concerto e o gancho que permitiu ao MC puxar uma plateia um quanto apreensiva. “Água do Bongo” e “Pobre de mim”, temas habituais dos seus concertos, reavivaram a memória de antigos álbuns. A meio, o rapper debita um “vou só deixar mais um pedaço de mim”, embora seja o seu amigo imaginário que lhe escreve as letras. Percorrendo as restantes faixas do antecessor de Auto-Sabotagem, deu tempo ainda para um “Funeral” sem cigarros e para fechar com as célebres “Nós e Laços” e “Subtítulo”.
Nerve, cujas expetativas “não são cenas megalómanas”, está no seu primeiro ano a viver em exclusivo da música, pelo que este EP, afirma, “é um símbolo dessa disponibilidade que eu estava a falar e a ideia é, de alguma forma, e de uma forma um bocadinho hipócrita, se calhar atacar a indústria que me alimenta, daí o nome auto-sabotagem.”
Em “Pedragelo” dizia que “se a vida são dois dias vou dedicar um dia aos beats e outro dia às letras”. Talvez neste EP, que foi produzido na íntegra por Nerve, já se perceba que os dois dias do MC não foram desperdiçados.
Por Bruno Fidalgo de Sousa
Fotografia de Diana Reis