O nome do álbum reflete a nossa tentativa de expressão que muitas vezes parece não ser realmente ouvida
Mx e Norty são rappers naturais de Guimarães e Famalicão, respetivamente, que têm vindo a marcar a cena underground no norte do país. Composto por nove faixas, ECOS DO VAZIO é o primeiro álbum colaborativo da dupla, que anda em busca de novas sonoridades entre o rage e o super trap. No dia de estreia da dupla em Lisboa, encontrei-me com eles para ficarmos a saber mais sobre o álbum e sobre o processo criativo dos rappers.
Foi numa festa do coletivo Quarenta E Oito que se conheceram. A partir daí, demorou muito até começarem a trabalhar juntos?
[Mx] Para ser sincero, a primeira vez que conheci o Norty foi no Enterro da Gata, mas foi apenas aquele trocar umas palavras, eu estava com os meus amigos lá e não o conhecia muito bem. A primeira vez, talvez, que falámos mais a sério foi numa festa da Quarenta e Oita ya, na primeira vez que lá fui. Nessa noite é que conheci o pessoal todo e onde eu me realmente integrei no grupo. Quanto a trabalharmos juntos acho que foi quase direto. A Red Dot foi o nosso primeiro som juntos, para o meu álbum Lágrimas de Sangue. Passado uns 2 meses de o conhecer eu fiz o som com o Lil Noon e achámos que era um som onde o Norty dava para entrar, então passado uma semana ele entrou e ficou essa a nossa primeira cena juntos. Depois disso foi a Alma Vaga.
[Norty] Foi um bocado a partir daí. Quando fizemos a Red Dot percebemos que a cena funcionou bem, nem tou a falar em termos de alcance, mas sim porque sentimo-nos bem a trabalhar um com o outro. Mais para a frente fomos a Coimbra e gravamos a Alma Vaga com o bapcat para as bacpcave sessions.
Queria saber sobre isso. Como é que surgiu o convite?
[Norty] O convite inicialmente foi feito ao Mx, ele é que depois, como já estamos bué close e a pensar no álbum juntos, sugeriu fazer um episódio comigo na bacpcave. O bapcat achou grande ideia, o TrillSeco, que foi um gajo que deu imenso love no Red Dot, também curtiu e o resto do pessoal lá de Coimbra igual.
[Mx] Quando eu senti que havia sinergia entre nós os dois e que quando ia atuar ao Maus Hábitos ou ao Cru, por exemplo, via que o som que mais batia era o Red Dot porque ele (Norty) tem uma presença em palco mesmo boa, percebi que queria trabalhar mais com ele.
Depois disso e com muita tosta mista em cima, surgiu ECOS DO VAZIO. Porquê este nome?
[Norty] É verdade [risos]. Primeiro, só antes da questão, este álbum surgiu de uma festa no Maus Hábitos, onde nós só nos viramos um para o outro e dissemos: “mano, é para fazer um álbum?”, e fechamos a ideia de fazer o projeto. Para nós Ecos do Vazio representa o que foi um pouco o retiro, a gente isolou-se para fazer o álbum, ficamos lá só a cozinhar novas cenas – fizemos se não me engano 14 sons – e a trabalhar naquilo. O nome reflete a nossa tentativa de expressão que muitas vezes parece não ser realmente ouvida. A estética toda do álbum gira em torno de um pico de uma dimensão gigante, onde não tem nada à volta.
[Mx] Queríamos mostrar essa isolação durante esses 7 dias, onde só fazíamos mesmo música e desenvolvíamos a nossa amizade. O nome também reflete a nossa fase naquela altura, uma fase meio melancólica para o dois e amadurecimento. A PODE SER QUE EU ENTENDA reflete bué isso, liga-se ao título do álbum por essa melancolia e esse “desespero”.
Fonte: Apple Music
É por isso que foi das únicas que teve videoclip?
[Mx] Ya, nós sentíamos que esse som era aquele que transportava mesmo aquilo que estávamos a passar na altura. É dos meus sons preferidos até aos dias de hoje.
[Norty] Escolhemos essa música também por ser um grito de guerra, é um grito que um gajo dá sem saber se realmente vai ser ouvido. Foi um som que durante o processo encaixou logo na cabeça do pessoal, e que fez a malta perceber também que era algo mais que uma música.
A partir dessa música e da KRIMINAL, diria, o álbum vai muito mais abaixo. Torna-se algo mais experimental.
[Mx] Mais experimental, exatamente. Sinto que a malta que nos acompanha estava à espera de que o álbum fosse outro tipo de cena, algo mais hard e mais rage. Sou aquele tipo de artista que não curto que me encaixem numa vibe especifica, quero fazer um pouco de tudo. ECOS DO VAZIO é um projeto bué experimental, tem de tudo.
[Norty] Foi uma superação artística, do género, eu sentir que era impossível adaptar-me a sonoridades novas. A LÁGRIMA CAI, por exemplo, nunca na vida acharia que num dia normal iria chegar ao estúdio, abrir aquele beat e fazer um som. O facto de eu ter tido essa abertura e ele (Mx) me ter permitido isso, foi um incentivo.
De que forma é que vocês se envolvem no trabalho um do outro?
[Norty] A frontalidade é o ponto principal. Ele se não curtir de uma cena, sei que vai ser o primeiro a dizer que não sentiu e ele sabe que é recíproco. Este álbum ajudou-me imenso a ser mais aberto a experiências e a fazer algo diferente, percebi que quanto menos vidrado estiver em algo e quanto mais polivalente conseguir ser, mais completo serei como artista.
Lil Noon, Kastro, h1zas e Cardu são os nomes que vemos por trás da produção do álbum. Como é que funcionou o processo de criação? Eles (produtores) chegavam já com beats e vocês rimavam, ou foi um exercício conjunto de produção do zero?
[Mx] O Kastro acompanhou-nos no retiro todo. O Lil Noon esteva lá dois dias onde num fizemos a KRIMINAL, a SERPENTES era um som que já tínhamos gravado no estúdio dele, e a PODE SER QUE EU ENTENDA foi uma collab dele com o Kastrp. O Cardu foi lá ao retiro dois dias e estivemos nesses dois dias só a trabalhar na KEEP GOING.
[Norty] A seleção dos produtores foi super orgânica, são pessoas do nosso grupo que gostamos bué e que sabemos que têm ganda talento. O h1zas, já veio numa situação diferente, a ROGB era feita num beat da net, que não conseguimos pegar por causa de umas exigências do produtor. Tivemos uns stresses a tentar fazê-lo então acabamos por fazer um remake desse beat. Esse som teve até uma versão do Kastro, mais duas do h1zas e uma do Lil Noon até. O h1zas veio ajudar muito nessa missão de conseguir fazer um beat de supertrap, nós sentimos que ele era o gajo ideal para vir com essa cena, até porque já tinha feito dois sons no Lágrimas de Sangue, e identificamo-nos imenso com a sonoridade dele.
Fontes: Norty e Mx
Agora com o lançamento do álbum, têm a cabeça mais desligada da música ou continuam a criar?
[Mx] Sim, sim. Já estamos a pensar em lançar novas cenas.
[Norty] Ele estuda e eu trabalho, mas o tempo que sobra do dia deixamos nisto. A gente quer viver do que ama e estamos dispostos a fazer tudo mais alguma coisa para conseguirmos estar fechados no estúdio e fazer disso vida.
Ano de 2024, lançaste o teu (Mx) primeiro álbum, Lágrimas de Sangue. A música Inocência teve direito a uma versão com um verso do João Não, que depois até se juntou ao lançamento da Escuridão. Como é que surge esta entrada dele na faixa?
[Mx] Isso foi bué engraçado por acaso. Eu não conhecia o João, apesar de ser muito fã dele, mas ainda assim tínhamos em comum trabalharmos com o Lil Noon. Uma vez o João foi lá ao estúdio, o Lil Noon mostrou-lhe o som e o João adorou e gravou um verso. Depois de ele ter gravado, ligou-me por videochamada, mas eu não atendi [risos], estava no autocarro e fiquei meio parvo porque nunca tinha falado com ele e sou mega fã. Ele voltou-me a ligar, eu atendi e ele disse-me que tinha gravado esse tal verso na Inocência e que achou que era ganda som.
No teu caso, Norty, 2024 ficou marcado com o teu segundo EP: ME, ME & ME. Já contaste que quando eras mais novo o rock e o metal eram os estilos que mais ouvias. Ali a SPAGHETTI já é um cheirinho do que poderia ser um Norty vocalista de uma banda.
[Norty] Ya,ya, já temos um cheirinho do que é que é essa influência toda da infância. Claro que a SPAGHETTI é uma cena mais lowkey, que acaba por ter um switch para trap, mas ali já consegui mostrar aquilo que para mim foi uma influência durante bastantes anos. O rock tem uma influência mesmo grande em tudo, eu adoro o rage porque é essa fusão do trap com o rock. Este estilo moveu imensa gente lá fora, como no caso do Playboi Carti que através deste estilo meteu a malta a passar essa influência para a forma de vestir, por exemplo. Quando vi que os dois géneros que mais gostava tinham sofrido essa fusão, senti que era um bom momento para mostrar que era de onde eu vinha. O SPAGHETTI foi um dos sons que saiu nesse registo, mas tenho mais coisas gravadas nessas vibes de mais rock e assim.
O que é que andam a ouvir que vos inspira?
[Norty] Eu ando a ouvir bué Nettspend, OsamaSon…agora tou-me a esquecer de mais [risos].
[Mx] Eu ouço bué musica diariamente, mas colo mais em músicas do que artistas. Neste momento, diria talvez Profjam, Lil Peep, Yung Fazo, XXXTentacion, é o meu artista favorito, Destroy Lonely.
[Norty] Também tenho ouvido cenas mais experimentais tipo 070 Shake, Mike Dean, The Weeknd. Para mim os sintetizadores poderá ser uma cena que vá explorar imenso agora, este estilo está me a abrir bué a mente.
Já com uma data no Porto e uma em Guimarães feitas, logo à noite têm marcada a vossa estreia na capital. Expetativas altas?
[Norty] A gente veio um bocadinho naquela de ver como são as cenas por aqui em baixo. Querendo ou não, é uma festa underground, e lá em cima o underground é uma cena que mexe muito forte.
[Mx] O que eu sinto também é que no Porto, ou em Guimarães que é a minha zona, estamos em casa. Sei que o pessoal consome as cenas e realmente vais às festas porque é tudo bué próximo. Na capital, nós não sendo de cá e tendo uma exposição mais baixa, estando agora a furar mais a bolha, não coloco as expetativas muito altas. O set vai ser diferente do que foi no Porto e em Guimarães também porque é mais curto.
[Norty] Onde eu, pessoalmente, acho que vou sentir mais diferença é na energia do público. Quando fomos ao Maus Hábitos, o álbum tinha apenas duas semanas, mas já havia gente a cantá-lo word by word. É a primeira vez que jogamos fora, então também viemos numa de apalpar terreno, mas estou muito feliz por cá estar.
[Mx] Mas apesar disso, shout-out à Eclipse por nos terem convidado e estou bué feliz também por estar aqui em Lisboa com a malta toda para apresentar o projeto.
Fonte: Norty e Mx